Um dia o mundo acordou e ninguém mais sabia respirar inconscientemente.
Inspire…
Expire…
Em questão de minutos o caos tomou conta de tudo, pessoas desesperadas morriam em crises de pânico, outras porque não conseguiam mesmo pensar na ordem certa de respirar o tempo todo.
Depois de algumas horas a população já era bem menor. Programas de relaxamento, com aqueles professores magros de yoga e exercícios para grávidas tomaram as tv’s. Surgiram programas de rádio que simplesmente tinham uma mulher gravada falando “Inspire, Expire”.
Alguns cientistas apareciam por pouco tempo em algum lugar tentando dar uma explicação, mas era difícil se comunicar, faltava ar, a frase de um deles, mais pessimista, ficou famosa no dia, “não fomos feitos pra respirar sozinhos, não sabemos respirar, precisamos de ajuda, deus, por favor”.
Comer era horrível, pessoas se engasgavam na confusão de engolir e inspirar, expirar.
Quando anoiteceu só sobravam alguns, tentando se ajudar. “Um homem da inglaterra parece ter conseguido adaptar aquelas máquinas de hospital para voltar a respirar normalmente”, diziam os boatos. Pra que? Eu me perguntava.
Por quanto tempo você aguentaria?
Conseguiria desistir e pronto?
No terceiro dia somente quem não tinha dormido esse tempo todo continuava vivo. O homem da inglaterra no fundo nunca existiu, ou morreu também, talvez porque confiou demais na sua máquina.
No quarto dia só sobraram os insanos, felizes com aquilo tudo, felizes com um mundo só deles, sem preocupação nenhuma, ou medo. Só precisavam inspirar, e expirar.
No quinto dia o último dos homens morreu. Era uma mulher na verdade, com distúrbio de atenção grave. Pra ela se dedicar simplesmente a inspirar, e expirar era fácil, irônicamente.
No sexto dia o mundo ficou vazio, em silêncio, sem alarmes e sem surpresas.
No sétimo dia uma casinha pequena e suja, no meio do nada, acendeu uma luz. De lá saiu um menino, o único que ainda conseguia respirar normalmente. “Poxa, será que eu dormi todos esses dias?”.
Ele não tinha nome, mas gostava do Fantoche, um super-herói de uma antiga revista em quadrinhos guardada no que ele chamava de “cofre mágico”. Na história, o Fantoche enfrentava o maligno Destructon, um robô criado pela antiga união soviética para destruir toda a fonte de alimento da humanidade.
O menino logo ficou sem leite, e sem pães. Foi até a cidade, mas todos estavam mortos. O Sr. Begins do mercadinho estava numa pose engraçada, com os olhos vidrados e abraçado no seu cachorro. O cachorro tinha uma faca no peito.
“Adeus Sr. Begins”, ele disse. “Até a próxima quinta”.