A magia do natal na infância está na ideia de que o mundo é cheio de possibilidades e coisas que você não conhece ou sabe se são reais. A qualquer momento um senhorzinho vai chegar voando e deixar presentes que de alguma forma são exatamente os primeiros da lista que você fez (ou segundos, ou terceiros). Só por isso ser tratado com normalidade por todo adulto que você conhece já indica que devem existir tantas coisas que não sabemos.
Depois de certa idade tentamos resgatar esse sentimento desperadamente, recriando as tradições ano após ano pra ver se a mágica volta. O que veio primeiro, o espírito do natal ou a mentira consciente que essa época é inocente então temos que ser bons uns coms os outros? No fim a repetição ano a ano de tentar recriar tradições acaba matando a ideia básica de que existia alguma mágica ali.
Minha família é bem grande. Todas as grandes festas religiosas eram motivo de se reunir na casa de alguma das irmãs de meu pai e cozinhar mais coisas do que essas 40 ou 50 pessoas conseguiriam comer em uns 3 dias, tanto que a maioria acabava levando sobras pra casa. Ou se reunia de novo nos dias seguintes.
Hoje eu passo esses datas sozinho. Eles ainda estão lá, ainda se reúnem. Mas depois de sair da bolha familiar você percebe a sujeira. E lembra do que acabou normalizando porque ninguém ensina a entregar seus primos. O problema é a avalanche que vai te encobrir só mais tarde, quando tiver perto dos 30, num fim de tarde ensolarado mais frio que o normal. Você não pertence mais. E essa realização parece tão pequena, mas bate tão forte. Como quando você bate o dente no copo e nenhum dos dois quebra, mas seu coração perde algumas batidas. Não sei pra onde elas vão.
Me conformei que dificilmente vou conseguir ter um natal feliz, apesar de adorar o natal, e tudo que ele representa. Posso estar em uma fase ótima, mas é uma parede enorme pra escalar todo final de ano, com pequenos bilhetinhos a cada 5 ou 7 metros lembrando que eu mesmo escolhi isso. Minha família é perfeita e eu me isolei. Meus amigos me convidaram e não quis ir. Poderia ter procurado uma saída mas envolvia palavras demais.
Não fico exatamente triste com isso tudo. Tristeza não é a palavra. Assim como felicidade não é a palavra pra descrever o sentimento do natal. É algo mais complicado que isso. Talvez essa seja a verdadeira mágica, pro bem ou pro mal. O bom é que já passa. Sempre passa. E ano que vem espero ter uma parede menor pra subir. Ou luvas melhores.