Bad Luck

Bad Luck

Categories blur

Sentada na frente do espelho, ela se pergunta porque não tem ninguém ali pra escovar seu cabelo. Porque ninguém quer elogiar meus sapatos novos? Apesar de se orgulhar da criatividade dos seus desenhos na aula de artes, admite que as frases que inventa nas conversas com ela mesma, através do espelho, estão se repetindo e ficando previsíveis. “Você me decepciona, garotinha.” Diz, sempre com medo de olhar nos próprios olhos. Ainda assim ela conta piadas e fofocas para a sala vazia, sorrindo e dando gargalhadas. Por alguns momentos se pergunta porque a menina do espelho nunca sorri junto com ela, mas sempre segundos antes ou depois, como se estivesse presa em outra realidade que já foi ou vai ser.

Talvez se desenhasse máscaras com o batom na superfície fria, seu reflexo se tornaria outra pessoa. Alguém que quisesse ouvi-la, segui-la, correr na chuva de mãos dadas, fugindo da própria vida.

A sala está cheia de coisas. Milhares de brinquedos, livros, jogos. Mas de forma misteriosa, nada disso é visto no espelho. Só ela. Só seu lindo vestido. E ainda assim ela se vira para a porta de vez em quando, num engano recorrente de que ouviu passos chegando, que alguém veio brincar, trouxe coisas novas, interessantes. Coisas que estão ali, encaixotadas ao redor do banquinho.

Ela imagina como seria se saísse procurar lugares especiais. Lugares de outras pessoas. Balanços embaixo de árvores velhas. Barcos que há muito foram esquecidos, presos na beira do rio. Casas caindo aos pedaços, mas que conseguem ter uma beleza interessante, somando a vivência de todos que já passaram por ali. Por um ou dois momentos, esses lugares parecem tão lindos! Mas nenhum é dela. Nenhum vai satisfazer tanto quanto seu pequeno quarto, com o espelho grande.

Categories blur

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *