Um amigo com camisetas vermelhas demais teve a ousadia de perguntar para onde vao as mariposas depois do nascer do sol. Foi uma das últimas perguntas que ele fez.
Ele tinha esse problema com o próprio coração. Não no sentido romântico da coisa, valha-me Deus entrar nesses assuntos mórbidos. Ele achava o coração um órgão estranho demais. Alienígena, nas suas próprias palavras. “Já pôs a mão no peito e ouviu a coisa bater?” Ele dizia. “É assustador. Tu dum. Aquilo está vivo. Tu dum. Batendo. Tu dum. Esmurrando sua caixa toráxica, desesperado para sair. Tu dum. Tu dum.”
Mas voltando as mariposas, sua teoria era de que nunca viu uma de dia. E como raios todos aqueles insetos malditos se esconderiam? E pior, porque? Deviam ser amaldiçoados, como os vampiros. Ou melhor ainda, como lobisomens, que se transformavam a noite, e de dia eram apenas borboletas. Cabe obervar sua estupefação com o fato de nunca ter visto uma borboleta depois do sol se pôr, igualmente. Quando decidiu prender uma e esperar anoitecer, nunca mais o vi.
Decidi que se daqui a dois anos não estiver satisfeito com as cores das minhas camisetas, questionarei a forma como Deus comanda as coisas também, assim como meu amigo fez. Decidi que quero escrever um livro sobre os motivos de me suicidar, e se durante (ou após) esse processo não achar os argumentos do meu Eu Lírico convincentes, pulo da ponte mais próxima. Não sem antes deixar uma matéria de três laudas para os principais jornais do país expondo a teoria das mariposas.
Não sem antes parar para ouvir meu coração. Por favor acredite, digo isso sem o menor teor romântico piegas, só quero escutar a droga batendo mesmo. Tu dum. Rachando meu peito. Tu dum. Quebrando costelas. Tu dum. Saindo, enforcando-se nas próprias artérias como um animal inconsequente. Tu. Dum.