Pulmões

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Na última aula de biologia eu não aguentava mais o sono, botei a cabeça entre os braços na mesa e fechei os olhos por um breve momento. Ai abri eles de novo, já olharam fixamente pro escuro? Nem eu. Até esse dia, sempre evitei tentar ver o que está ali, fora de foco, distante. Mas decidi olhar, ver o que existia no escuro.

Primeiro era uma bola negra flutuando lentamente. Foi aumentando e percebi que eu estava indo em sua direção, cada vez mais rápido. Senti uma força absurda me puxando pelas pernas mas não conseguia fazer barulho, era como se todo o ar deixasse de existir.

Quando acordei estava num lugar horrível, seco. Várias pessoas empurravam enormes sacos de moedas colina acima, fazendo um esforço absurdo e, quando chegavam no topo, não suportavam o peso e rolavam até a base para começar tudo de novo.

Estava no inferno, no 4º círculo para ser mais exato, o círculo da avareza e desperdício. Fiquei inconsciente pelos três primeiros círculos, limbo, luxúria e gula. Ainda bem.

Flutuava rápido, sento arrastado e vendo todo o sofrimento das almas julgadas lá embaixo. Passei pelo 5º círculo (raiva e mau humor), assustado com a fúria que as almas brigavam umas com as outras pela eternidade nas águas de um pântano escuro. O 6º círculo era bonito de se ver ao longe, mas horrível quando passei ao lado de tumbas flamejantes e dos gritos que vinham delas.

O 7º(violência) chamou minha atenção, era dividido em três partes, um rio de sangue fervente onde os pecadores da violência eram imersos, árvores e arbustos que frutificavam os corpos de suicidas e alimentavam harpias e abutres, e um deserto de areias quentes onde blasfemadores jaziam deitados.

Apenas descendo uma montanha enorme era possível chegar no 8º e 9º círculos. O 8º (fraude) era separado em 10 partes, que não consegui identificar além dos falsos profetas, que possuíam as cabeças viradas pra trás, sem ver nada do que vinha a frente. E no 9º (traição) já podia sentir o frio, vendo traidores enterrados no gelo.

O diabo fica no centro, tentando fugir mas não consegue pelos ventos frios que o aprisionam. Ele mastiga grandes traidores com raiva. Ali eu parei, ele me olhou nos olhos e eu senti tapinhas nas costas:
– Bonito hein, dormindo de novo.

E a professora me pediu para descrever o aparelho digestivo do gafanhoto, eu sabia mas não quis responder. Também não sei dizer porque não quis responder, mas isso não é interessante, eu acho.

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