Ela sempre se considerou normal, diferente das pessoas que procuravam ajuda em anúncios de jornais baratos e freqüentava grupos anônimos. Mas depois de passar 3 meses e 12 dias (acredite, você também saberia) com insônia, estava desesperada. Li em algum lugar que depois de muito tempo sem dormir você vive amortecido, pensando lentamente, atrasando sinapses, memória já não é mais algo que se pode dar ao luxo de ter. Tudo parece distante, ecoando e nada faz efeito, nada mesmo, valium, álcool, éter, morfina.
Você só quer dormir, simples, deitar e dormir e sonhar com qualquer coisa que voe.
No jornal tinha um anúncio simples (simples demais, diga-se de passagem): Quer Dormir? Temos a Solução. E um endereço. Sem telefone ou o nome confiável do médico com 7 graduações diferentes e a família mais sorridente do mundo.
Era um apartamento deprimente, que um dia teve o que chamavam de papel-de-parede mas só de citar isso lá dentro ouvia-se ruídos de tristeza vindos das paredes. Aqueles lugares onde com certeza existem espécies não-catalogadas de fungos e uma ou outra mutação de barata com rato. E tinha uma placa empoeirada dizendo que ali era a clínica do Dr. Hans. E ali, esperando no sofá rasgado ela sentiu sono, sem saber explicar porque. Queria deitar, sem dar a mínima para os insetos que corriam dentro das espumas do sofá ou para a música country tocando no rádio, só queria deitar e dormir.
Mas a secretária chamou, abrindo a porta com um ar de “entre logo, vamos, quero terminar de fazer as unhas.”
Na sala só tinha uma cadeira, dessas de dentista. O tal de Hans estava de costas, e sem se virar pediu que ela se sentasse. Com um movimento rápido, ficou de frente e colocou uma venda nela. claramente tinha feito isso centenas de vezes.
“Meu procedimento é muito eficaz, não se preocupe. Em quinze minutos você vai estar dormindo feito uma pedra. Lidamos com o pagamento mais tarde.”
Não tinha certeza se aquilo era tranquilizador ou assustador, e ficou quieta esperando, agora no escuro. Será que o sono no sofá da recepção era influenciado por alguma coisa desse tratamento? Algum produto químico no ar ou algo assim?
A resposta era não, soube assim que ele tampou seu nariz com um grampo, e amarrou as mãos e pés na cadeira. Não se sentia confortável com aquilo, mas diabos, tudo para dormir algumas horas.
Em seguida ele botou um fone de ouvidos, e ela não podia ouvir nada. Tentou falar alguma coisa mas não tinha certeza se as palavras chegaram a sair da boca ou só imaginou, estava ficando tonta com aquilo tudo.
E a cartada de mestre do tratamento, um saco de lixo preto, foi colocado na cabeça e puxado para trás. Ora vocês sabem como, amigos, já devem ter visto em cenas de hollywood. Ela tentou gritar, respirar pelo nariz, se debater. Mas a privação de sentidos só fazia com que o corpo entrasse em colapso mais rápido. E no fim ela estava mesmo dormindo feito uma pedra, como o prometido.