Se você der a sorte de ter um relógio de bolso naqueles raros momentos em que não temos nenhuma obrigação, preocupação, desejo ou qualquer coisa que faça o Senhor do Tempo nos vigiar para ver se não pulamos alguns segundos, pode viajar por ai. É só arrastar os ponteiros para trás, ou avançar, mas aviso de antemão que o futuro é cinza demais.
Pode ir no começo do mundo. Minutos antes do que pode ser considerado vivo nascer. Pode estar lá quando o primeiro pingo de chuva cair. Pode gritar e ter a certeza de que não vai ser ouvido. Ali você é verdadeiramente sozinho, e nem a saudade existe. Os malfeitores não surgiram, e nada foi destruído. Vai se esquecer de tudo, menos da calma e do silêncio.
Aproveite, porque o Senhor do Tempo vai te encontrar, e esbravejar sobre já ter avisado para não fazer isso. Vai tirar o dobro de anos da sua vida do que tirou da primeira vez e enviar para um tempo que não era seu, nem no início, nem antes de voltar no tempo.
Suas memórias vão durar, e de certa forma agora você é o ser mais velho que já existiu. O primeiro a ver um pôr-do-sol e correr de braços abertos. Vai sentir a idade chegando e rir dela, até que não consiga mais ver muito bem e perder a audição de um dos ouvidos. Então pode contar sua história a netos e bisnetos, em como conheceu o Senhor do Tempo, e viraram amigos agora. Conversam sobre coisas mundanas que logo vão sumir e apostam em qual relógio para antes.
Um dia vai acordar e ter a mesma idade que tinha quando viajou da última vez. Vai encontrar o relógio no bolso e saber que virou o novo Senhor do Tempo, procurando pessoas que viajaram para onde não deviam, e pularam alguns segundos.