Eram garotos que, além de outras coisas, sorriam quando o sol não brilhava, sem se dar conta disso.
Nunca trocaram muitas palavras, somente cumprimentos banais, como aqueles que damos a certos tipos de cactus. A diferença é que para pessoas, sorrimos.
Outra coisa que tinham em comum era notarem aquela garota, que sorria mais quando dizia não, do que quando dizia sim, o que era no mínimo, peculiar.
Um dia nenhum deles foi a aula, nem os garotos, nem a menina, porque o motorista do ônibus engasgou com a aliança nova que tinha acabado de comprar para a esposa, mas não queria que o assaltante do ônibus visse.
Todos eles morriam de tédio sem aulas, tanto os garotos quando a menina. Construíam barracas com cobertas, e ali dentro, protegidos por paredes mais fortes que aço, eles mudavam, eram diferentes.
Os garotos ganhavam poderes, de super heróis, mágicos, e a coragem de caçadores de tesouros. A menina tinha um jardim cheio de animais de estimação, ferozes, enormes, e de cores que ninguém jamais viu.
Um dia todos receberam mensagens, os garotos, e a menina. “Não faz vocês sorrirem? Quando o sol não brilha? Não brilha mesmo?”
As fitas que prendiam as cobertas de uma hora para outra perderam a cola. OS grampos de cabelo e alfinetes enferrujaram e quebravam facilmente. Mesmo jogando as cobertas por cima do corpo, sentiam coceira e juravam ver sombras por toda parte.
Durante a aula de ciências, enquanto a professora explicava que vacas conseguiam subir escadas, mas não descer elas, um dos garotos ficou de pé, e urinou nas calças. Uma menina vomitou ao lado dele, e 2 outras crianças choraram. O garoto com as calas molhadas puxou uma arma e atirou na professora, que caiu no chão mal conseguindo respirar.
O outro garoto levantou e começou a gritar uma canção, aparentemente era sua maneira de lidar com aquilo tudo.
A menina continuou desenhando, mas aumentou o sorriso no rosto. Um sol, um celeiro, e vacas subindo escadas.