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É uma sala, ou uma cela. Não tem nada aqui, além do ar úmido, e de um homem parado de pé no meio da sala olhando para baixo. Ele fica balançando de um lado para o outro bem devagar, baba caindo da boca, sujo e suado.
Vim parar aqui porque procurei a palavra dicionário, no dicionário. Vim parar aqui porque procurei o significado de significado.
O homem não me vê, ou finge que não. É absorto nos próprios pensamentos, ocupado demais sussurrando sua língua desconhecida e batendo a cabeça na parede de leve.
Ele tem cortes por todo o corpo, cortes pequenos, que parecem não cicatrizar nunca. Tem o cabelo comprido e a barba por fazer. Roupas que não posso mais chamar de roupas, são frangalhos de pano pendurados que, quando anoitece, mal consigo distinguir das paredes sujas de pedra.
Nunca conversamos, não quero conversar, e ele muito menos imagino. Quero ficar sozinho e perdido. Ele quer ficar perdido, e sozinho.
Nunca vi o homem comer. Talvez ele coma enquanto durmo. Não o vejo dormir também.
Começo a cogitar o que meus sonhos tentam me dizer. Ele não existe, não está ali. Já teria morrido.
Antes de perguntarem a presos condenados a morte o que queriam comer, deviam perguntar o que queriam ver. Podem ser fotos mesmo, vídeos com sorte, mas queria ver um documentário sobre o fundo do mar. Deve ser tão calmo lá embaixo.
Quero chegar no céu e perguntar a deus se ele acredita em si mesmo.
O homem passa o dia todo andando em círculos pela sala, ou cela. Olhando para baixo sempre, sussurrando.
Ele tem um corte em forma de rosto feliz na perna, desses que qualquer criança faz com 2 riscos para os olhos e um para a boca.
Me pergunto se sentem minha falta e, se sentirem, porque não me mandam bolos de fubá ou amoras.
Agora o homem não levanta mais, fica deitado cantando alguma música baixinho.
Preciso ver um sorriso, qualquer um.
Hoje achei uma lâmina de barbear. Fiz um rosto na minha perna igual o dele. Pra cada sorriso que você da aqui dentro, surge um corte. Não é tão ruim porque os sorrisos são raros.
Sonhei com uma floresta, e monstros peludos ficavam escondidos atrás das árvores. Mas eles não queriam me pegar, queriam meus marshmallows. Não dei nenhum a eles, comi tudo.
Agora sou eu quem fico andando em círculos e sussurrando.
O homem era coisa da minha cabeça. Fiquei louco. Ele era eu mesmo.
Quero acordar no colo da minha mãe. Pena que acordar é a coisa mais triste que já inventaram.
Vim parar aqui porque procurei a palavra dicionário, no dicionário. Vim parar aqui porque procurei o significado de significado.meu deus! que lindo isso.sobre acordar… queria acordar ao dormir e dormir ao acordar,bom negócio que seria.