You’re Just a Piece

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Antes de tudo vou fazer um discurso inútil.
Confesso que sempre tive uma atração preocupante por venenos ou qualquer coisa que faça alguém se intoxicar. Como remédios demais. Curioso como um ou dois comprimidos ajudam a curar muita coisa. Mas dez ou vinte deles são uma das mortes mais tranqüilas.
No fim você não ganha das doenças, somente troca elas por outras, que na maioria das vezes vão vir quando você for velho e não conseguir mais lembrar se seu irmão se chamava Bob ou se esse era o cachorro.

Até vitamina C em excesso é ruim. Até o sol é ruim. Aqueles comprimidos rosados que sua mãe dava quando você era criança, e eram melhores que qualquer bala (talvez porque ela impedia você de tomar muitos), provavelmente vão fazer algum mal.

Não falo nada disso com aquele discurso imbecil de “oh meu deus estão nos intoxicando, vamos consumir coisa naturais”. Se você pensou isso e me achou o novo messias no começo, saia daqui e vá comprar sua aveia ou algo que o valha.

Bom, a questão é que conheci esse cara. Drogado, viciado em 3 ou 4 substâncias diferentes, não necessariamente ilícitas (é como viciar em programas de auditório), e que dizia poder conseguir qualquer coisa que eu quisesse.
Pedi sódio puro. Eles vem em barras, e você provavelmente nunca vai chegar perto de uma. As barras não tem uma marca, ou laboratório que faça elas. Se tiver mesmo vontade de descobrir de onde essas coisas vem, não duvidaria que encontrasse uma garagem ou um galpão atrás de um colégio infantil onde o sujeito responsável por limpar o parquinho no fim da tarde sintetizasse tudo que é substância.

Peguei minha barra, tem o tamanho de uma barra de chocolate média, numa embalagem branca com fita adesiva enrolada. Imagine aqueles tijolos de cocaína dos filmes, só que menor.

Preparei uma banheira velha que ficou em uma construção abandonada. Outra curiosidade, quando as pessoas se mudam, elas levam tudo, menos as banheiras. É sério, até aquelas com pezinhos que teoricamente seriam fáceis de mudar de lugar. Não sei muito bem quais os motivos, mas um empregado dessas lojas de “compre tudo que quiser” me disse que eles sentem nojo das banheiras quando se mudam. É como reaproveitar a privada de alguém. Só que esse alguém era você mesmo, na casa antiga.

Enchi ela com água, o que levou mais tempo que imaginei. Acendi um cigarro e fiquei na porta do banheiro olhando. Sabia já o que ia acontecer mas sempre nos surpreendemos. Sabia também que ia me surpreender, mas mesmo assim, ia me surpreender. Eis o motivo do cigarro, podia ser meu último cigarro. Apoiei meu ombro e fiquei olhando as paredes. Quando arrancam o papel de parede podemos ver rabiscos de casinhas feitas com giz de cera, aqueles riscos que usaram pra medir a altura de alguém. Depois cortes na madeira “não há luz no fim do túnel. não há brilho”.

Fim do cigarro, fim da amizade, como diria algum amigo destacável que conheci em certo bar, pus no bolso mas esqueci de tirar quando lavei, e virou uma papa cheirando amaciante.

Joguei a barra e virei o mais rápido que pude, tropecei e cai de boca perto da escada, a tempo de ouvir o estrondo e os pedaços de cerâmica voarem.

Dou dez minutos pra polícia chegar e registrar tudo como “vandalismo envolvendo materiais caseiros resultantes em um explosivo rústico”.

Voi’la, um momento importante da minha vida, que vocês provavelmente nunca vão entender.
Pensem sobre momentos importantes da vida. Como seu aniversário de 8 anos, com aquele bolo enfeitado e heróis nas paredes. Que merda foi aquela? Uma festinha idiota com crianças gordinhas correndo e sua mãe pensando “puta que pariu vou ter que limpar isso tudo depois”. Dou 2 meses, no máximo, pra você aproveitar os presentes. É e você julgava isso importante.

Minha explosão de banheira com sódio em uma casa abandonada vai ser um dos momentos mais felizes da minha vida.

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