Pearly Gates

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Esta é a história da pequena Frances e seu pinguin de pelúcia, que ela curiosamente chamava de Sr. Sr.

Frances ganhou o Sr. Sr. de sua meia-tia Luize, que por sinal não gostava nem um pouco de Frances, e pediu para um rapaz estranho que trabalhava com pra ela comprar um urso de pelúcia, no dia em que Frances nasceu. O rapaz estranho escolheu um pinguin com olhos mais estranhos ainda, e uma cor meio acinzentada, porque ele era daltônico.

A meia-tia Luize nem chegou a ver o pinguin, só entregou o embrulho para o pai de Frances e voltou tomar seu chá com 3 torrões por favor.

No fim Frances não largava mais do Sr. Sr., que ganhou esse nome porque quando ela perguntou ao seu pai que nome devia dar ao pinguin, ele disse “Sr. … Sr. …” e desmaiou de tão bêbado.

Ela era uma garota curiosa, em todos os sentidos da palavra. Não entendia porque a “maldita velha” que morava ao lado jogava borra de café nas plantas, mas no seu pequeno mundo o Sr. Sr. fazia isso porque “oras bolas Senhorita Frances, se posso ter chá e café numa mesma folha, porque diabos teria dois bules ?”.

Uma das coisas que Frances mais gostava era encontrar outras coisas. Coisas que as pessoas perderam por ai, seja lá o que fosse. Não sussegaria até bolar uma história boa para a coisa, e enxeria seu pai tanto que ele mandaria ela “pro raio que o partisse com essas perguntas sem sentido menina, e pare de trazer lixo para casa”.
Em seu quarto ficava um pequeno bauzinho, com um santo à cavalo sempre em cima. O santo costumava segurar menino jesus, mas ela arrancou porque afinal, como alguém vai batalhar segurando um bebê? Ele que procurasse a virgem Maria ou algo que o valha.

Dentro do bauzinho ficavam as coisas que Frances encontrava por ai (e um gnomo de jardim que roubou da casa verde do outro quarteirão, porque ele não tinha 1 perna, no lugar botaram um pedaço de pau, o que acreditem ou não, acabou se tornando o primeiro gnomo pirata que já existiu. Seu nome era “Gnomo Gordinho”.

Com o tempo Frances foi crescendo, Sr. Sr. foi desbotando e perdendo os olhos, até ficar velho demais e pegar fogo misteriosamente.
Seu pai fazia ela trabalhar em qualquer coisa suja e deprimente, como lavadora de pratos, encarregada do óleo de fritura da praça de alimentação do shopping, recicladora de esterco.
Um dia Frances fugiu, de mochila nas costas, um vestido, e a cueca onde seu pai guardava dinheiro.

Ele provavelmente se matou quando descobriu do dinheiro. Frances saiu por ai procurar coisas novas.
Conheceu uma senhora gorda que era viciada em dietas. Encontrou várias que funcionariam, mas era simplesmente viciada em dietas, não queria emagrecer mais.
Frances achava dietas uma droga. Não porque teria que ficar sem comer nem nada assim, mas porque você saberia exatamente o que comeria hoje, e amanhã, e depois.

Por toda placa que ela passava deixara um desenho do Sr. Sr. e uma mensagem.
As placas e os desenhos acabavam virando seu diário. Em dias bons Sr. Sr. aparecia de óculos escuros, sorrindo, e tinha frases como “Eu conheço um gnomo pirata e você não” ao lado.
Em dias tristes ele aparecia pegando fogo e “Você nunca mais vai comer pudim” escrito.

Um dia ela começou a beber pra caramba e tomar todo tipo de droga. O que mais gostava era acordar no outro dia, e lembrar das coisas como se fossem sonhos. Sem a certeza que aconteceram ou não, vagas lembranças que iam vindo nos momentos mais estranhos.

Frances acabou tendo como companhia um caramujo, que durou 3 semanas. Ele morreu esmagado quando ela sentou no banco de um caminhão, pegando carona. Veio a viagem toda chorando, e o motorista perdeu a vontade de fazer sacanagens com ela por isso, o que foi bom.

Frances morreu num dia de chuva, no meio da rodovia, quando atravessou correndo pegar uma flor branca que estava do outro lado.
Caiu no chão ainda consciente, lembrou das tardes de chá com o Sr. Sr., e como ele era esperto por ter chá e café ao mesmo tempo.
Quis ter uma xícara, e fazer um chá das pétalas daquela flor, na água da chuva.

Parecia que nunca mais ia parar de chover, o que era bom, porque ai ela teria o que esperar. Esperar por um dia de sol, imaginar como seria.

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