Clown Car

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Só criei coragem para sentar no balcão do bar depois dos 30. Não que isso precise de muita coragem, pra começo de conversa. Mas não deve ser visto como algo corriqueiro. Para alguns, Hollywood glamouriza romances, casamento, ascensão na fida financeira. Pra mim, glamourizou o balcão do bar. E creme de amendoim.

Depois do terceiro drink um cara vestindo o que deveria ser a boina preferida do bisavô dele perguntou se eu gostaria de voltar no tempo, retendo minhas memórias. Não em corpo, mas em mente. Voltar para quem eu era dez anos atrás. Quinze. Vinte anos. Não conseguia desviar o olhar daquela boina. Admiro muito essas pessoas com desapego suficiente pra vestirem qualquer coisa. “Vinte e cinco era o limite.” – ele disse. Mais que isso e eu seria uma criança muito diferente. Por mais que tenha noção que devo agir como criança, vou deixar escapar palavras que nunca ouvi, olhares em decotes ou o simples tédio. É raríssimo uma criança entediada. Mas um adulto no corpo de uma criança, sem poder refletir sobre estar ou não na idade de sentar no balcão do bar, se entedia facilmente. E aí começariam as visitas no psicólogo. Diagnósticos infantis que vinte anos atrás eram precários e me deixariam meio grogue. Conversas demais.

Falei que sim, que voltaria sem dúvida nenhuma. Perguntei e o que ele faria. Assim, no formato de resposta “tudo bem sim, e você?”. Voltaria sim, e você? E você?

“Todo mundo nesse bar voltaria.” – ele diz olhando pro garçom, que por sua vez olha pra porta, que não olha pra ninguém. – “Mas ao contrário do que imaginam, chegariam exatamente no mesmo ponto da vida.” E realmente acredito nisso. Diabos, arrisco dizer que estariam aqui nesse bar da mesma forma. Sabe quando nos videogames você chega em determinado lugar, mas não está satisfeito, então começa de novo. Só que dessa vez faz melhor. Mais rápido, sem tantos erros. O final continua o mesmo, sendo triste ou feliz. O que mudou foram seus sapatos. Ou talvez o tipo de merda que grudou neles.

Se voltasse no tempo, dez, quinze, vinte anos atrás (não mais que isso), não sentaria em balcões de bar até chegar de novo nesse dia. Nesse bar. Usaria mais boinas, isso com certeza.

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