Macbeth

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– Com licença? Doutor? Você tem um minuto?
– Sim. Qual a pergunta?
– É mais um problema… um sujeito na Sala 3.
– Qual o problema?
– Esse é o problema, nós não sabemos.
– Cadê a ficha dele?
– Aqui.
– Não tem muita coisa útil aqui.
– Não doutor, nenhum trauma físico. Sinais vitais estáveis.
– Nome?
– Não sabemos.
– Alguém deixou ele aqui? Talvez possamos falar com eles. Vamos procurar algum histórico dele.
– Sem documentos. Nada. – respiração pesada no fundo – E ele não fala com ninguém.
– Bem, vamos dar um olá. Bom dia, sou o Dr. Dawson. Como você vai hoje? Olhe, você está seguro aqui. Nós queremos ajudar, mas precisamos que você fale conosco. O que aconteceu? Me conte tudo.

– Sou imaginário.

– Como assim imaginário?

– Não existo de verdade. Só existo nos momentos que vocês querem que eu exista. Depois eu desapareço, e se perguntarem às suas mamães elas vão inventar que estou viajando ou que estava cansado. Mentira. Estive aqui o tempo todo, invisível, mudo, tremendo, mal conseguindo respirar, esperando que se lembrem de mim, que queiram brincar comigo.

– Você se perdeu? É isso? Onde você mora?

– Você não entende, não é? Vá embora, vá procurar outros amigos, me esqueça, não quero mais ser lembrado.

– Olhe, eu posso encontrar seus pais ou amigos, mas preciso que me diga seu nome, ou onde mora. Prometo que vamos te ajudar.

– Não quero ajuda, quero ficar sozinho. Porque não entendem, porque não vieram quando eu gritava por ajuda? Porque não me ouvem agora que peço para saírem? Porque me olham assim?

– Como veio parar aqui? Quem te trouxe?

– Ninguém me trouxe, eu apareci, apareci quando você precisou Dawson, apareci nos seus três anos, saindo de trás da árvore quando aqueles garotos te usavam de alvo na guerra de balões d’água, e viramos amigos, eu não queria saber seu nome, nem de onde veio, nem porque chorava.

– Como… como você sabe disso? Quem é você? Vamos, diga logo antes que eu chame a polícia!

– Sou quem esteve do seu lado, esperando você voltar ao quarto depois de apanhar do seu pai. Escondido no banheiro da escola, sempre pronto para te distrair quando roubavam seu lanche. Inventando histórias novas para os brinquedos quebrados pelo vizinho malvado.

– Saia daqui, vá embora, agora, enfermeira tire esse sujeito daqui, se ele se recusar chame a segurança.

– Isso Dawson, me mande embora, era o que pedi, obrigado. Assim como fez aos quinze anos, se esqueceu, me deixou ali, chamando, com aquele sorriso idiota no rosto, sempre pensando que as brincadeiras tinham perdido a graça, quando fui eu quem perdi, fui eu, e agora você quer me ajudar, mas não consegue, ninguém consegue. Ninguém.

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