Pecado

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Histórias nascem em quartos pequenos, com camas que rangem ao deitarmos e pouca luz.
Logo antes de dormir, um momento indefinido em que provavelmente a maioria das coisas mais improváveis acontece.
Como sair em um veleiro em que as velas são borboletas gigantes, e as praias tem areia branca. Foi para essas praias que nosso personagem viajou.

Estava entediado porque teria que sair em excursão com a escola, e sempre são para lugares sem graça como parques sujos e estádios todos iguais uns aos outros. Na estação de trem, enquanto esperava com todos os alunos a professora checar pela terceira vez qual o portão certo, deixou cair uma bala enorme que tinha comprado pelo preço de duas. Ainda não sabia se valeria a pena, mas gastou todo o dinheiro e não podia desperdiçar tudo só porque era atrapalhado.

A bala rolou e rolou e entrou em uma sala com a porta semi-aberta, que dizia “Limpeza”.
Entrou la e estava escuro, mas a bala brilhava. ‘Que estranho’, ele pensou, não sabia que ela brilhava no escuro.
Ela brilha.’ Disse uma vozinha mirrada e tímida. ‘Tudo aqui brilha no escuro, aliás, aqui não existe o escuro, você quem o trouxe.’
‘E como eu me livro dele’, perguntou um já bem espantado garoto, segurando uma bala brilhante contra o peito, como se alguém pudesse surgir e roubar seu mais precioso tesouro.
‘Ora, da mesma forma que se livra de todas as coisas, mandando elas embora.’
Então o garoto pensou e pensou em como mandar o escuro sair dali, se deveria ser educado e pedir licença, ou se talvez o escuro fosse mesmo tão assustador quanto diziam, e quem sabe se irrita-se com esse pedido.
Resolveu parar de acreditar no escuro, afinal nada existe quando paramos de acreditar, como aqueles gnomos estranhos que apareciam no jardim e escondiam as chaves do seu pai.
De uma hora pra outra, ele esqueceu do escuro, e conseguiu ver tudo. Centenas de seres pequeninos olhando pra ele com cara de espanto, esperando o primeiro movimento.
Com uma risada o garoto disse que estava tudo bem, ele só queria pegar sua bala.

Depois descobriu que estava em um porto, e que nesse mundo brilhante os barcos eram o principal meio de transporte. Foi assim que ele acabou no veleiro das borboletas, e atracou na praia branca.

E mais ou menos nesse ponto, quem estava ouvindo a história vai dormir, e sonhar. E amanhã, na época em que acordamos cedo sem sequer pensar em coisas fúteis como o tempo ou a falta dele, vamos criar barcos de madeira e papel, e esperar o próximo momento logo antes de dormir, para ouvir o final da história.

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