Hoje um arbusto pegou fogo e Deus apareceu. Ele deu um bocejo e perguntou que horas eram. Eram onze e meia. Deus disse que estava difícil manter os olhos abertos com toda essa luz, e que nunca tinha concordado muito com essa coisa de iluminar. Depois o arbusto pigarreou e parou um pouco, como se estivesse pensando. Deus não pensa, eu acho. Ele estava acompanhando tudo que tinha acontecido. Depois de um segundo ou dois, ainda sem saber se ele demorava alguns milésimos para processar ou se era onisciente mesmo e só estava meio atordoado pelo que viu, Deus perguntou:
– Porque eles filtram tudo pelo que a droga da sociedade diz?
Não entendi muito bem, então engoli o orgulho e perguntei mesmo:
– Ahn?
Deus balançou a cabeça e falou sozinho. Tenho que admitir que esse cara tem mais poder do que todos para te fazer sentir no vácuo. Talvez porque ele seja o vácuo e tal. Mas bem, Deus explicou que o único ponto que tinha deixado ele, *pausa*, encucado, foi que as pessoas procuravam passar todas as informações por um filtro imaginário, baseado no lugar em que viviam, ou na forma como cresceram, etc.
Não eram sinceros. Não diziam o que pensavam. Formulavam pensamentos e passavam pela peneira do julgamento. “Será que essa ideia seria aprovada?”, “E se mudarem o que pensam de mim por isso?”. Nada era dito como se era pensado inicialmente. Tudo passava pelo tribunal da comunidade.
Deus então fez surgir uma árvore de figos do nosso lado, um pouco mais do meu lado, fazendo com que eu pulasse de susto. Comeu dois frutos e sumiu. Ouvi uma voz agradecendo por tudo e tive a certeza inexplicável que nunca mais viria o sujeito.